Tuesday, August 22, 2006

22.

Agosto vem brutal.
Ora ele me atropela com toda a sua aspereza, ora me carrega um pouco e me mostra alturas.
Ao som de Nina Simone e "He's got the whole world" eu tento dançar, apesar de não saber. Tão devagar.
E só pra constar: hoje começa meu inferno astral.

Monday, August 14, 2006

Pássaros.

O meu pai é um lunático.
Ele tem a alma mais musical do mundo inteiro. Acho que ele é um maestro.
Pinta antenas de amarelo. Deve ser porque ele tem o sol dentro dele.
Ele dança a vida, mas ninguém lhe disse ainda. Nem eu.
Ainda não disse que o amo também. (algumas dificuldades com isso).
O meu pai é uma criança, como eu.
Acho que ele se jogou de cabeça numa espécie de vida sem cor, por isso tem os cabelos tão branquinhos.
Hoje, 62 anos depois, vejo ele Frida Kahlo, Almodóvar, Miró.
Cheio de tons, nuances e urgências.
Acho que ele descobriu, 2 derrames depois, que somos perecíveis. E resolveu enlouquecer um pouco, ser um pouco mais vermelho, mais ébrio, mas feliz.
"Por um segundo mais feliz" .
Meu pai descobriu como escutar os silêncios que tomam a gente vezenquando. Isso faz dele um ' escutador ' de belezas, de feiúras, de delírios e misérias.
Porque sim, os silêncios nos dizem tanto.
E porque raramente a gente gosta de ser escutador de si mesmo.
Escuta-dor.
E aí, voltando a ele: o meu pai me ensinou a voar desde cedo.
Ele me colocou em lugares nos quais eu tinha a exata sensação de penhascos, de ribanceiras.
O meu pai me ensinou liberdades. Voar é uma maneira de se libertar.
Soltou pássaros quando eu não compreendia o porquê.
E agora ele anda apaixonado por músicas, que também nos libertam. Ou nos escravizam. No meu caso, tento achar os vãos das notas para escapar por eles.
Até chegar ao infinito.
E perecer de tanta boniteza.

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Wednesday, August 09, 2006

Não se mova

Há em mim uma bagunça generalizada.
Não sei onde estão as coisas. Aliás, elas estão espalhadas, todas. E sem função. E sem sentido.
E aí eu sei que nem tudo deve ter um sentido, segundo Clarice, a Lispector, mas e segundo eu?
Pra mim, é preciso fazer sentido?
Se sim, então qual o sentido?
Se não, por que não abdico dessa lógica maldita que me ronda e joga charme?
Estou perdida no meio de mim mesma, no meio de toda a minha poesia, do meu desespero e da minha loucura.
Sou roda-gigante.
Sou redemoinhos, marés, incoerências.
E sou vaidade.
Descobri que sou egocêntrica, que só olho pro meu próprio umbigo e pior: acho que o mundo todo gira em torno de mim.
Se não gira, deveria girar, claro. Mas é claro. Afinal, eu sou a tal.
Essa minha empáfia me deixa absolutamente enjoada de mim.
Que mais me falta? Um altarzinho no quarto? Sim, porque as fotografias estão lá. Pencas delas.
Eu aprendi que também não sou Dalai Lama (Cá, sentiu né?) mas eu também não posso ser essa coisinha insuportavemmente vaidosa all the time.
Preciso descobrir se o que quero é por vaidade ou por desejo grande e bonito.
Eu estou farta de semideuses, neste caso, estou farta de mim.
Não consigo caber em lugar nenhum.
É isso. Um não-lugar.
"Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo".
Ei, você, não se aproxime.
Estou nociva. Não vou fazer bem.
Não se mova.

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Eu não sei se consigo.
Juro que não sei.

Friday, August 04, 2006

O sol

E o sol apareceu, numa sexta-feira.
Noite dessas também.

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Antonio Maria é a minha mais nova descoberta.
Um trecho:

"Através dessa janela vejo coisas que, antigamente, eram poderosas e fecundas. O céu repete o azul de tantas tardes acontecidas em maio, as últimas quaresmeiras do verão agonizam na saia do morro, os homens martelam a pedreira... e eu não sinto vontade de rir ou de chorar. Na rua, arrastando uma corrente eterna e incompreensível, passa mais um caminhão da Standard Oil... e eu não sinto nenhum vexame político, nenhuma revolta social. Por isso e pela descrença que em meu espírito se acentua, permite que eu deseje ser só — ou teu somente — num lugar do mundo onde os gritos não tenham eco, onde a inveja não ameace, onde as coisas do amor aconteçam sem testemunhas. Livrem-me da pressa, das datas, dos salários e das dívidas e a todos serei agradecido, num verso submisso. Livrem-me de mim, de uma certa insaciabilidade que apavora e de todos serei escravo numa humilde canção. Permite que eu só queira, agora, esse canto de sono e preguiça, onde não necessite dos atletas, onde o céu possa ser céu sem urubus e aviões, onde as árvores sejam desnecessárias, porque os pássaros se sintam bem em cantar e dormir em nossos ombros."

In: "Com vocês, Antonio Maria."

Tuesday, August 01, 2006

Oito

Agosto chegou.
E com ele, todo o frio peculiar. E uma certa falta de beleza.
Tentarei flanar.

Friday, July 28, 2006

Amanhecimento

Assoviar levinho os pensamentos matinais, os primeiros, penteá-los.
Pensar assim:
pencas de flores debruçadas pelo caminho
derramamento de turquesas, como presentes deixados por uma espécie de deus
trinta e oito cócegas feitas pela asa esquerda de um pássaro verde
aromas de renascimento em meio ao loiro claro do dia
dorme-dormes acarinhando os dedos, brincando manhas
uma borboleta vermelha
uma joaninha feliz
um alvoroçamento de alaranjados

tudo isso para começar a pentear os cabelos dos pensamentos. matinais.

(inspirada num conto do Caio).

Wednesday, July 26, 2006

Pensações

De volta.
Depois do processo, depois de um mês, exatamente um mês da estréia.
Depois de surpresas, sustos, depois da mais profunda tristeza e insatisfação, depois do meu olhar blasé pras coisas todas, depois de inúmeras tentativas e erros no processo de reinvenção.
Mais erros, se é que se pode chamar qualquer ato em prol dos milagres pequenos de erro.
Pensei em republicar por aqui todos os meus textos, os bons.
Pensei em dizer amenidades, bobissas, o cotidiano. Pensei em tornar públicas as minhas fantasias mais recônditas, usar este espaço pra explorá-las e depois de lê-las, correr para concretizá-las.
Pensei em morte, pensei na vidinha-idiota e na morte de novo, pensei nas grandezas que já me fizeram cantar.
Pensei em Caio Fernando Abreu e na sua desesperada vontade de amor, na exaustão depois de tanta solidão que teve.
Pensei febres,
colapsos,
vertigens,
apazigüamentos.
Realizei rompantes,
estranhezas e estranhei a mim mesma, processo normal, talvez, dentro de um processo de destruição.
Lendo, lendo, lendo.
"Pequenas epifanias" do Caio. Meu quarto livro dele.
Influenciada pela Carol, que me disse que era quase um diário, uma coisa bem descomprometida.
E eu, neste processo, preciso de algo um pouco assim, até que me organize melhor dentro do meu próprio caos.
Termino o texto e abro a volta com uma frase, dele, do Caio:

"Continuo pensando que, quando tudo vai mal, sempre se pode cantar. Por isso, escrevo."

Não tão mal, eu sei. Mas num momento de descobrimentos.